Neste livro, Oliver Sacks conta curiosos casos presenciados e relatados de como a música pode influenciar, positiva ou negativamente, a vida das pessoas. O livro é dividido em quatro partes: a primeira conta como a música se aloja no cérebro, das maneiras mais variadas; na segunda, os casos mostram os diferentes graus da influência da musica, desde a amusia até os savants musicais; no terceiro, demonstra como a música pode atuar com outras funções do cérebro; e, finalmente, a subjetividade das emoções provocadas pela música em pacientes.
O que aprendi: os impressionantes casos reais foram muito interessantes. Alguns chamaram mais a minha atenção, outros menos, mas todos foram capazes de prender minha atenção e me fazer refletir e provavelmente me lembrarei bem deles, a menos que eu tenha uma amnésia, como um dos casos relatados, de perda de memória de questão de minutos e a impressionante manutenção da habilidade de tocar as músicas apesar da perda da memória dos fatos (e de abraçar a esposa toda vez que a visse como se ela tivesse sumido por muito tempo). Essa história, em particular, é uma das mais emocionantes e interessantes. Descobri que, ainda que não lembrasse de um acontecimento de minutos atrás, o paciente era capaz de aprender músicas novas. Isso somado ao fato de não se lembrar de fatos da época em que conheceu a esposa, mas reconhecê-la, em particular (impossível não lembrar do filme "Como se fosse a primeira vez", piadas à parte). O primeiro caso é do médico que ganhou habilidades musicais acima do normal após ser atingido por um trovão, momento no qual tem uma "Experiência Quase Morte" e tem a sensação de estar vendo o próprio corpo da perspectiva externa (por sinal, um outro livro que estou lendo - Muito além do Nosso Eu, do Miguel Nicolelis - e um terceiro que li recentemente - As portas da Percepção/Céu e Inferno - também descrevem esta sensação). É um caso em que habilidades reprimidas são liberadas. Ao lado disso, houve grande aumento da religiosidade, atribuindo o fato de ter sobrevivido e ganhado a habilidade a um poder maior, sendo provável que a descarga elétrica e os momentos de falta de oxigenação do cérebro tenham influência também nessa crença. Um outro caso, dentro da série de casos de convulsão devido à música, foi da pessoa que tinha convulsões com o sino da igreja. Mostra como algumas pessoas podem ficar com música na cabeça repetidamente, chegando a atrapalhar a qualidade de vida e como isso se parece com Tourette e TOC, fisiologicamente. E fecha essa série com as alucinações musicais, quando os pacientes tinham a verdadeira impressão de estar uma música tocando, mas, na verdade, geralmente devido à perda parcial ou completa da audição, ser fruto da imaginação. Ou melhor, era uma audição de fato, gerada pelo próprio cérebro, devido à perda da entrada de dados. Na segunda parte, lembro dos casos das diferenças de percepção da música, de cantores que não percepiam cantar mal, das diferenças entre a percepção da técnica e da melodia. Também os casos de amusia, a perda da percepção da música, relatos do tipo "a música parecia uma série de ruídos metálicos", sendo que o próprio Sacks teve um caso de amusia após uma enxaqueca. Existem diferentes níveis de amusia: a que não reconhece música, mas reconhece vozes e outros sons, o não reconhecimento de ritmo, o de tons, a "amelodia". No capítulo sobre o "Ouvido Absoluto", há a questão do treinamento de crianças, que possuem maior probabilidade de incorporar a interpretação de sons como uma função da fala e, nessa mesma relação com a fala, temos a característica de maior probabilidade de ouvido absoluto em países com entonação musical da fala (vietnamitas). Comecei a respeitar mais os limites do ouvido com os fones de ouvido que detonam as células ciliares, responsáveis pelo ajuste fino de tons no ouvido. Por serem sensíveis, a incidência de sons altos pode destruí-las irreversivelmente e podemos cair em um dos casos em que há perda de um tom específico (o afinador de piano que não conseguia afinar uma tecla específica). Infelizmente, temos que concorrer com sons ambientes para ouvir nossas músicas em paz, porque, fora a barulheira de sempre, tem gente que põe música desagradável pra ouvirmos à força e concorrer com o barulho externo só piora as coisas. A perda do input de um ouvido pode tornar a música menos agradável pela perda da percepção da pequena diferença de tempo da chegada dos sons, entretanto, micromovimentos com a cabeça podem tentar captar novamente essa sensação, tanto para o visual (perda de um olho) quanto pro auditivo. Os casos dos savants musicais: pessoas com poucas habilidades sociais, mas capazes de lembrar de músicas sem nenhuma dificuldade. Música e cegueira: mostra como a perda de um sentido pode potencializar o outro, mesmo em idade mais avançada e o exemplo do sucesso no jazz de cegos.
O capítulo de sinestesia foi um dos que mais me impressionou porque eu achava que isso acontecia apenas em situações de uso de drogas ou de operações, mas são, de fato, sentidos comuns de algumas pessoas. Não é fácil testar a sinestesia porque, principalmente quem não tem ouvido absoluto, não há uma cor específica para um tom específico, mesmo para uma pessoa específica. Foi proposto que a sinestesia é padrão em bebês, que ainda não possuem a divisão definitiva das áreas do cérebro, e que vão se especializando com o avançar da idade, exceto para as pessoas que mantém essa habilidade. A terceira parte contém as histórias mais emocionantes e motivantes do livro, de casos de pessoas realmente ajudadas, libertas de seus fantasmas fisiológicos, através da música. E já no primeiro capítulo dessa parte, sobre a amnésia, é um pouco pesado (o livro em geral é bem leve, mas os casos da experiência quase-morte no primeiro capítulo, este da amnésia e de Parkinson foram os que me deixaram emocionado e, ao mesmo tempo, um pouco assustado) pela assustadora sensação de que, apesar da falta de memória, em alguns momentos o paciente tinha ciência de que estava sem memória e que não tinha perspectivas de ir adiante. Quase pulei este, mas li e valeu a pena, é uma bela história, apesar de triste.
A próxima temática é como a música pode ajudar pessoas que perderam a habilidade da fala. Eu já tinha ouvido histórias de que pessoas com gagueira cantavam perfeitamente e falar cantando era uma forma de se expressar melhor. E isso é realmente verdade e aplicado à pessoas que perderam totalmente a habilidade de falar. Uma citação do livro que me chamou a atenção foi de "Admirável Mundo Novo", sobre o aprendizado em bebês através da música hipnótica. Como a o ritmo pode melhor inserir um fato na memória, mas não torná-la informação. É o caso de pessoas capazes de falar um grande texto em seqüência, como um atendente de telemarketing ou o famoso "dois-hambúrgueres-alface-queijo-molho-especial" e ainda, orações. No caso do Admirável Mundo Novo, as crianças conseguem apreender a lista dos maiores rios do mundo mas não conseguem responder qual o maior rio do mundo. Ele cita o exemplo específico de um garçom:
Em pacientes com Parkinson "pós-encefálicos", existe uma tendência a não tomarem atitudes, mas conseguirem responder. E a música pode ser o catalisador para que estes pacientes saiam da sua inércia.
E os relatos são realmente milagrosos, este capítulo é dos meus favoritos. Da velhinha que não se movia, mas saía de sua paralisia só de pronunciar "Opus 49", mostrando, de certa maneira, que o problema não estava com a imaginação em si, e sim com a dificuldade em tomar uma "ação mental".
Soma-se a essa parte, ainda, a história do pianista que, mesmo com o braço amputado, conseguia "tocar" com seu membro fantasma (essa abordagem dos membros fantasmas, estou lendo, com uma temática um pouco mais pesada, no "Muito além do nosso eu") e da síndrome dos movimentos específicos, que impedia, a nível de cérebro, os instrumentistas de prosseguir praticando e como o botóx pode ajudá-los, ainda que não totalmente, para além das aplicações estéticas mais conhecidas.
A história das crianças autistas também me chamou a atenção, sobre como elas, apesar de sua aparente indiferença, poderiam ser extremamente musicais, sendo a musicoterapia uma forma muito interessante, assim como para as pessoas com Alzheimer e Parkinson, para autistas, diminuindo seus tiques. A quarta - e última - parte fala sobre emoções. Nos casos de depressão, mostra, como já suspeitava, que a música pode ser uma poderosa arma.
Porém, não é uma garantia, não é um remédio e, às vezes, é preciso expontaneidade ou talvez surpresa.
A música pode ser uma forma de exposição da perda da inibição ("impulso do id" - fronteira freudiana para os impulsos animais do ser humano, controlados pelo superego). Foi o caso de uma senhora, já num asilo, atingida por demência, que acabou por perder sua inibição e cantava sem parar.
Além da história da memória, outro trecho bem triste está nesse capítulo sobre a demência frontotemporal:
É algo pra se pensar, não só aí, mas em muitos outros casos, metaforicamente... Esta demência pode ser "benéfica" no sentido de liberar a criatividade e o talento reprimido, mas o avanço é inevitável, e detona outras habilidades consigo.
Síndrome de Williams era algo que nunca tinha ouvido falar nem nunca vi uma pessoa. A descrição, no livro, me lembrou a dos hobbits - festeiros, ingênuos, com um rosto característico e extremamente musicais.
Também descobri, a partir de uma discussão, logo no começo, entre escala diatônica e cromática, que Si bemol não é o mesmo que Lá Sustenido, pesquisando na internet. Por uma pequena diferença quase desprezível de freqüências, são diferentes em instrumentos não-temperados, mas são iguais em instrumentos "quantizados".
Algumas músicas citadas:
Referências que me interessei:
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*ao som de Jethro Tull e Beatles
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